Com a Rampage Rebel em caminhos “de A a Z”
Um test-drive de quase 550 km, do urbano à aventura (algo involuntária) com a picape nacional de 272 cv.
Texto e fotos de Henrique Koifman
No comecinho de abril, aproveitei um feriado e peguei a estrada com a Rampage, primeira picape da marca Ram produzida aqui no Brasil. A versão que usei foi a Rebel 2.0 turbo a gasolina (não, não é flex), e rodei com ela quase 550 km – entre asfaltos urbanos e estradas que poderiam ser classificadas como “de A a Z”, da melhor rodovia a pior estradinha de terra enlameada. Falo sobre a experiência neste post.
Começando em baixas velocidades
Como a concessionária em que retirei a Rampage ficava no Recreio dos Bandeirantes, aproveitei a proximidade para fazer umas fotos dela, ainda bem limpinha, na praia de Grumari – um dos meus cenários favoritos para isso (acima). O trajeto é curto, com quebra-molas, ladeiras, curvas e limite de velocidade bem baixo. Mas, de cara, deu para sentir um pouco da dinâmica do carro.
Com um motor 2.0 turbo a gasolina, de 272 de potência e pouco mais de 40 kgfm de torque, já nas rotações mais baixas, ela se comporta de maneira parecida àquelas picapes parrudas que têm motores V8 aspirados (cada vez mais raras): basta você tocar no acelerador para sentir a força disponível. Subidas, partidas e retomadas não demandam muito giro do motor – a menos que você queira dar um pinote, claro – e, aí, segundo a fábrica, ela é capaz de acelerar de 0 a 100 km/h em curtos 6,9 segundos.
É lógico que o som que se escuta nessa Rampage é um pouco diferente das V8, mas nem tanto. O pessoal da Ram caprichou no escapamento – que é duplo –, pensando também no lado, digamos, musical da coisa, e o rugido é afinado.
Pouco ouvi desse repertório, porém, nas duas horas seguintes. Depois das fotos, enfrentaria um daqueles engarrafamentos enjoadíssimos que costumam separar a Barra da Tijuca da Zona Sul do Rio, roubando horas de nossos dias (no final do teste, devolvi o carro e voltei da mesma concessionária usando o transporte público – BRT + metrô – em um terço do tempo, ou menos; fica aqui a dica de um automaníaco realista). Para tentar diminuir o consumo (e as emissões) nesses casos, a Ram instalou um dispositivo de “start-stop” (que desliga e religa o motor em paradas breves) na picape. O câmbio automático de nove marchas tem funcionamento suave e, no trânsito, é quase imperceptível.
Pegando a estrada com a Rampage Rebel
Uma outra coisa que você percebe logo que começa a usar a Rampage é que, mesmo sendo uma picape alta, pesada e comprida, ela é extremamente dócil e confortável para se guiar. É claro que ela continua a mostrar suas dimensões e peso – afinal, é uma picape compacta média de pouco mais de 5 metros e 1.900 kg – ao longo dos caminhos, mas passa ao motorista uma sensação de controle acima da média. Algo que, dias depois, seria ainda mais notável, quando tive de fazer uma série de ultrapassagens em uma (boa) estrada de mão dupla.
Com longas retas de bom asfalto à disposição, tecla “sport” do câmbio acionada, pude pisar fundo para ultrapassar caminhões e gente sem pressa. E aí essa Rampage arranca com a agilidade de um esportivo, ganhando velocidade de forma empolgante e que exige certo juízo. Vá lá que, com as já mencionadas dimensões e peso – e a esse último se somavam os de quatro ocupantes e suas muitas bagagens, alojadas na caçamba – a tal “agilidade de um esportivo” está mais na aceleração em si.
Com a altura e a massa, nesses momentos você sente bem o deslocamento do peso. Mas com o câmbio funcionando de forma esperta e a tração sendo distribuída de forma automática (e criteriosa) pelas quatro rodas, a picape se mostra bem plantada no asfalto, inclusive em manobras de direção e curvas mais fechadas.
Um pouco adiante, chegamos à Serra de Friburgo que, ao menos na subida, conta hoje com uma terceira pista, pela qual é possível ultrapassar veículos mais lentos, quase sem sustos. Quase, porque mesmo com a duplicação, o trajeto antiquado e sinuoso da rodovia continua o mesmo do tempo de meus avós. Novamente, para uma picape de quase duas toneladas, a Rampage mostrou um bom comportamento, tanto em freadas quanto em retomadas nas saídas dessas curvas.
Em geral, o câmbio responde bem e rapidamente às necessidades de trocas de marchas, mas também é possível fazer isso usando as borboletas atrás do volante – um recurso que eu usaria mais na viagem de volta, serra abaixo, para gerenciar o freio motor.
De Rampage na chuva, na lama, na fazenda (e, ainda por cima, à noite)
Chegamos ao alto da serra e lá, além do anoitecer, encontramos chuva. Nosso destino era um sítio em Macaé de Cima, na região de Lumiar, separado do asfalto por uns 10 km de estradas de terra razoáveis e, no trecho final, bem ruins. Condições que se tornaram, digamos, um tanto mais radicais debaixo da tempestade que passou a nos acompanhar em seguida. Tanto melhor, afinal, isto é um test-drive, certo?
Pois bem, bem plantada em bons pneus do tipo todo-terreno e com um sistema de tração integral realmente eficiente, a Rampage impressionou bastante bem na empreitada. Especialmente nos últimos três ou quatro quilômetros, quando muita lama e pedras em subidas estreitas bem puxadas passaram a ser “emolduradas” por barrancos e precipícios. Na parte mais complicada, com “lama de confeiteiro”, cheguei até a acionar o modo reduzido (low) do câmbio, mais por precaução que como remédio. Nessas situações, sentia leves perdas de trajetória aqui e ali, corrigidas em frações de segundos pelo próprio carro.
Além da tração, o tal torque abundante em baixas rotações passa a ser ainda mais importante em caminhos assim, especialmente quando ao volante está um motorista como eu, que é mais destemido (embora cuidadoso) que capacitado para o fora de estrada. E outra coisa que ajudou imensamente foram os excelentes faróis em full-LED, com iluminação direcional em curvas. Com eles, a quase falta total de visibilidade se transformou em caminho visível à frente.
Para não dizer que não daria para ser melhor, senti falta de uma câmera que mostrasse a área inferior à frente do carro, pois o capô é alto e, em caminhos acidentados como aqueles, em que no fim de uma subida pode ter uma pedra enorme, um galho caído ou um buraco fundo, a visibilidade em relação ao chão seria de uma tremenda ajuda. Taí uma coisa que a Ram poderia copiar dos Range Rover.
Outra queixa: com a chuvarada, entrou um pouco de água na caçamba e molhou parte das roupas de um dos passageiros, que não ficou nada satisfeito com isso.
Rampage Rebel 2.0 turbo a gasolina por dentro
A versão da Rampage que usei e que você vê nas fotos é a Rebel 2.0 turbo a gasolina, a segunda mais “simples” da linha – acima apenas da também Rebel a diesel, por R$ 252 mil. Tasco essas aspas aí pois a simplicidade em um carro de R$ 262 mil tende a ser relativa – e, felizmente, nesse caso é mesmo.
Extremamente bem-acabada, essa picape tem um interior caprichado, mais luxuoso e equipado, inclusive, do que estou acostumado a ver em utilitários até um pouco maiores e mais caros que, como ela, têm tração nas quatro rodas e proposta semelhante.
Bancos extremamente confortáveis em couro, partes acolchoadas no painel e nas portas, forrações e combinação bacana de materiais e cores, climatização perfeita… Tá tudo ali. Escrevi “bancos confortáveis”, mas vale mencionar que isso se aplica mais plenamente aos dianteiros pois, atrás, a despeito da ótima qualidade, o encosto traseiro fica numa posição um pouquinho mais vertical do que seria desejável (e confortável) – algo, aliás, bem comum nessas picapes de cabine dupla.
No mais, ela vem com bons multimídia e som, painel digital (em padrão equivalente ao de seus primos Stellantis Jeep), chave presencial com partida por botão e um isolamento térmico e acústico digno de elogios, também. Isso e mais alguns tantos itens que, me perdoem, não vou listar todos. Para quem tiver curiosidade, sugiro visitar o site da montadora.
E então, a Rampage Rebel 2.0 turbo a gasolina vale a pena?
Como comparação, sem sair do cardápio do grupo Stellantis, a Rampage é 30 cm menor que a Fiat Titano e 8,3 cm maior que a Fiat Toro, esta última, em porte, da mesma categoria que ela. Só em porte, pois os nada desprezíveis R$ 50 mil que ela custa a mais que as versões mais caras da prima Fiat (tanto a Toro Ranch quanto a Ultra saem hoje por 212.990) são até justificáveis.
A começar pelo motor Hurricane, que confere a ela uma performance à altura daquelas picapes clássicas norte-americanas de propulsor bem maior. Não por acaso, a mesma Stellantis está lançando por esses dias novas versões topo de linha dos Jeep Compass e Commander justamente com esse “furação” (a tradução para seu nome em inglês) sob o capô.
Não, com ele a Rampage não é exatamente econômica – minha média, entre os 160 km de estradas (muitos deles, infelizmente, engarrafados) as mais variadas e o trânsito em geral pesado do Rio ficou em cerca de 8,5 km/litro de gasolina. Por outro lado, uma picape semelhante, equipada com um motor de seis cilindros ou um V8 certamente teria mais sede. Enquanto não há modelos híbridos ou elétricos nessa faixa, este propulsor é provavelmente a melhor opção em termos de consumo x performance.
Somando a isso um ótimo sistema de tração e outros recursos, capazes de garantir que você vai chegar inteirinho àquele sítio no meio da roça, lá no alto da montanha, mesmo debaixo de uma tempestade e à noite; a um bom pacote de acessórios de conforto e de segurança (com assistentes diversos, de permanência em faixa, frenagem autônoma de emergência etc.), uma construção e acabamento caprichados e uma empolgante sensação de dirigir, fica difícil de comparar essa Rampage com qualquer outra picape de porte semelhante que você possa comprar por aqui, hoje. Respondendo, portanto, ao subtítulo ali em cima, sim, essa Rampage Rebel a gasolina vale a pena.
Na mesma linha Rampage, há opções com motores a diesel (menos potentes) e também com esse Hurricane a gasolina. Imediatamente acima da Rebel, está a Laramie Gasolina (R$ 272.990), que é um pouco mais recheada e traz grade dianteira cromada. E no topo da cadeia está a RT, de R$ 289.990, com apelo mais esportivo e uma série de itens a mais. Sua grade dianteira, porém, é pintada em preto – e quase igual a dessa Rebel que, pelo menos nesta primeira avaliação, me parece ter o melhor custo-benefício da família.
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