Um test-drive radical com a VW Amarok na Argentina
Por Henrique Koifman
Olhe bem para essas fotos da versão Extreme da picape média Amarok e me diga, quais são as diferenças em relação ao modelo 2022 que você identifica nessa, que é de 2023? Nem perca o seu tempo, você não vai achar nada de novo, nem por dentro nem por fora – porque não há, mesmo. E já que não havia nenhuma grande novidade para mostrar, a Volkswagen resolveu chamar um grupo de jornalistas para conhecer um outro lado desse utilitário, uma espécie de personalidade oculta, que raramente tem chance de se manifestar no dia a dia da imensa maioria de seus proprietários e condutores: as suas aptidões e recursos para o off-road. E lá fomos nós para a Argentina, onde a Amarok é produzida, conhecer e experimentar esse seu, digamos, lado mais agreste – ou selvagem.
Na verdade, nossa programação repetiu basicamente o que a VW do país vizinho oferece regularmente aos compradores da picape e, também, aos seus revendedores – que, depois da experiência, certamente voltam para seus balcões com o estoque de argumentos de venda ampliado. O programa se chama “Amarok Experto” e promove uma série de viagens de aventura e demonstrações em várias regiões do país vizinho, além de manter um campo de provas em uma hacienda (fazenda) a cerca de 100 km de Buenos Aires, para onde grupos são levados quase que semanalmente. Foi para essa segunda modalidade do programa que fomos convidados.
No início, era só asfalto bom
Nossa avaliação partiu da capital portenha, com suas ruas e avenidas bem pavimentadas, em uma manhã de trânsito intenso. Estávamos a bordo de uma Amarok V6 Extreme, a versão topo de linha do modelo – que como as outras é uma cabine dupla que mede 5,2 metros de comprimento e quase 2 m de largura. É, não é o ideal para o tráfego, mas também não atrapalhou, não. Quem sabe porque nossos hermanos sejam, na média, bem mais civilizados ao volante do que nós. Nada de carros ou ônibus fechando cruzamentos, caminhões descarregando mercadorias em fila dupla ou pedestres se jogando na frente do carro fora da faixa em uma avenida ou sem esperar que o sinal esteja fechado aos veículos.
Saindo da cidade, seguimos pela excelente Ruta Pan-Americana, com sua pavimentação perfeita e seis faixas de rolamento. A velocidade máxima permitida ali é de 130 km/h, o que permitiu uma boa média de cruzeiro. Num estradão assim, a Amarok se comporta quase que como um carro de passeio, especialmente em termos de conforto e nível de ruído. Afinal, seu V6 oferece 59,1 kgfm de torque (a apenas 1.400 rpm) e 258 cv de potência – que chegam a até 272 cv, se você, rodando em velocidades entre 50 e 120 km/h, enfiar o pé na tábua. Isso graças à sobrealimentação (overboost), que age por 10 segundos. Um tremendo “plus a mais” em manobras de ultrapassagem, por exemplo. Além disso, o câmbio automático de oito velocidades é tão discreto que eu só me lembrei dele na hora de reduzir as marchas manualmente – usando os providenciais botões atrás do volante.
Aliás, embora no geral tenha um temperamento mais para o sereno e equilibrado, a picape com esse motor V6 é capaz de acelerar quase que como um esportivo, fazendo o 0 a 100 km/h em 7,4 segundos (diz o fabricante). Na prática, dá para sentir bem tudo isso em arrancadas e retomadas. A Amarok Extreme até merece uma atenção um pouco maior que o habitual, pois é um daqueles carros que “anda muito mais do que parece”, seguindo plantadinha, quase silenciosa e totalmente estável a 160, 170 km/h, sem dar a menor pinta dessa velocidade toda – em trechos de bom asfalto, claro.
Só fui me lembrar que estava ao volante de uma picape quando, uns 80 km depois, pegamos uma estrada secundária que, digamos, estava no mesmo nível da maioria das nossas aqui no Brasil. E isso quer dizer que era forrada de remendos, não muito bem sinalizada e com um traçado nem sempre muito, hum, racional. A média de velocidade caiu para uns 70 km por hora e, a cada protuberância ou depressão mais acentuada no piso, sentíamos a bordo alguma oscilação – pouco, diga-se, para um utilitário de duas toneladas e com essa altura do solo, mas ainda assim, marcante.
Atravessamos, então, um pequeno vilarejo em Baradero que, de tão deserto, parecia saído do cenário de algum filme de bang-bang americano dos anos 1960. E, pouco depois, chegamos ao portão de uma fazenda. Dali até a sede, em meio a muita poeira, guiei por uns 2 ou 3 km de terra, bem plana e muito menos acidentada que o asfalto lá fora.
Um pouco de informação sobre o produto
A sede da tal hacienda, totalmente restaurada, data do final do século XVIII – fiz umas fotos da Amarok com ela de fundo, que você pode ver aqui no post. Mas nossas atividades se desenvolveram em outras instalações do lugar. Começando por uma apresentação bem completa, em que o pessoal da VW local nos relembrou a trajetória da Amarok, desde seu lançamento em 2010 – disponível apenas com motor a diesel 2.0 de quatro cilindros, em opções de 140 cv (versão mais simples, com cabine simples ou dupla e tração só nas rodas traseiras) e 180 cv (só cabine dupla, com tração integral) – até os dias de hoje.
Aqui no Brasil, atualmente, aliás, ela só é vendida com a mecânica V6 de 3.0 litros e 258cv de potência, em três opções de acabamento, enquanto na Argentina, há um leque bem mais amplo, começando pelo motor 2.0 menos potente e tração 4x2, mas sempre em cabine dupla. E, enquanto aqui o modelo se mantém lonja da liderança do segmento, lá, segundo nos mostraram em gráficos e números, a Amarok vem subindo de posição e hoje é a segunda picape média mais vendida.
Além da parte comercial, tivemos uma aulinha sobre as características da picape, em que foram realçados alguns de seus diferenciais em relação à concorrência – como o posicionamento dos feixes de mola traseiros nas laterais do chassi (e não abaixo dele, como é mais comum), a tração integral (4x4 permanente, sob demanda) e a largura da caçamba, com capacidade para até cerca de 1.200 kg. E, claro, um pequeno resumo de seus recursos, mecânicos e eletrônicos, para poder rodar em terrenos ruins e com segurança – ponto que, afinal, tínhamos ido conhecer melhor ali.
E agora, a parte mais divertida
Para ser sincero, quase nada dessa parte técnica, assim como o comportamento do carro na viagem de ida pela estrada, era propriamente uma novidade pra mim. Já testei – e viajei – com várias versões da Amarok aqui no Brasil, ao longo dos últimos 10 anos (aliás, vou colocar aqui embaixo um dos vídeos que fiz com uma delas para a TV Rebimboca). Daí que só fui me animar, mesmo, quando, finalmente, fomos convidados a caminhar até o campo de provas.
Lá, começamos com algumas demonstrações das aptidões da Amarok para vencer diferentes tipos de obstáculos e terrenos, como desníveis acentuados, areia fofa e até vê-la disputar uma espécie de cabo de guerra com um tronco de árvore bem grande. A cada passo, o instrutor explicava que recursos estavam sendo acionados, porque a picape se comportava dessa ou daquela maneira etc.
Em seguida, embarcamos novamente nos carros e, ao volante, entrei em uma trilha que começava na franja de uma pequena floresta, espalhada por um conjunto de colinas e escarpas, que separavam o local em que estávamos de um rio, algo como dois km adiante – e abaixo. E foi uma experiência e tanto. Com o modo “off-road” acionado, a ação do ABS dos freios se ajusta aos terrenos irregulares e escorregadios, onde cada uma das rodas da picape pode estar rodando sobre um piso diferente. Além disso, a tecla faz funcionar um providencial controle de descida automático, chamado HDC.
Segundo o instrutor, Martín, que nos acompanhava e orientava, o trajeto que percorremos – com uns 4 ou 5 km, por aí – foi construído usando como ponto de partida trilhas pelas quais seguia o gado criado na fazenda. E isso inclui desníveis laterais de até 30 graus, subidas e descidas pra lá de radicais, dois ou três trechos alagados ou riachos, pedras, raízes, troncos...
Uma roda empinada, “sobrevoando” o chão em mais de um metro aqui, uma rampa que mais parecia queda livre ali… De vez em quando, éramos orientados a desligar o controle de tração, ou acionar o bloqueio do diferencial, que age somente sobre as rodas do eixo traseiro, para passar por atoleiros, subidas mais escorregadias etc.
Raramente, porém, era preciso aumentar muito as rotações do motor. E, mesmo sendo um pouco comprida demais para um off-road – são 3,097m de entre-eixos –, não notei nenhuma pancada ou roçada de carroceria ao longo do trajeto. Bom, tudo ali provavelmente foi construído para que um carro com essas medidas pudesse passar, lógico, mas ainda assim, a coisa foi bem impressionante – e extremamente divertida.
Teve autódromo também
Depois da parte “selva”, guiamos até um pequeno autódromo nas vizinhanças, onde outro instrutor nos deu outra aulinha, desta vez sobre os recursos de segurança do utilitário. E, em seguida, pudemos testar boa parte deles na prática, em freadas, arrancadas e zigue-zagues radicais para levar a estabilidade da Amarok ao limite. Teve até Teste do Alce – e ela passou.
Terminado o teste, dirigimos os 100 km de volta até Buenos Aires, chegando justamente na hora do rush do final da tarde. Mas o que é um pequeno embotellamiento (engarrafamento em espanhol) para quem passou o dia se divertindo ao volante?
Brasileiros podem Dá para desse programa?
Se você ficou interessado no Amarok Experto, segundo a assessoria, o programa está, em princípio, aberto também para brasileiros. Basta que você consulte a disponibilidade, se inscreva e vá até Buenos Aires (os custos de passagens e hospedagens são por sua conta). Você pode se informar sobre isso em um concessionário da marca ou no site https://www.volkswagen.com.ar/es/amarok-experto.html . Além de conhecer a picape de um jeito que dificilmente poderia fazer sozinho, ainda dá para aproveitar e fazer turismo (ou vice-versa).
Em oferta
Neste mês de maio (até dia 31), a VW está oferecendo descontos nas três versões da Amarok que vende aqui no Brasil, o maior deles, para a “de entrada”, Comfortline – que dos R$ 296.860 de tabela está sendo vendida por R$ 240.456.
E a nova Amarok?
A picape média da VW acaba de ganhar uma nova geração, que está sendo lançada na Europa e na África do Sul – onde também é produzida. Esse novo modelo é, na prática, irmã gêmea da também nova Ford Ranger, pois compartilha com a americana sua base mecânica. Mas está praticamente descartado que essa Amarok venha a ser produzida aqui no Mercosul – mais precisamente, na fábrica da Volks em Pacheco, na Argentina (passei pertinho dela no teste).
Para o nosso mercado, a previsão é de que se mantenha a mesma base da versão atual, que, segundo pude apurar, deve receber uma série de retoques e novos recursos e equipamentos no final do próximo ano. Isso não quer dizer obrigatoriamente que a “nossa” Amarok vá ficar defasada, um conceito que não se aplica tanto a utilitários desse tipo da mesma forma que usamos com os carros de passeio comuns. O fundamental, mesmo, é que ela seja equipada com a melhor tecnologia no que diga respeito a segurança e eficiência. Hoje, por exemplo, já há rivais que trazem sistemas bacanas como o de frenagem autônoma de emergência, de manutenção de faixa e de distância para outros veículos, que a Amarok (ainda) não tem. Se receber essas e outras atualizações, não vejo motivos relevantes para aposentá-la, pois é uma boa picape – sobretudo boa de dirigir, dentro ou fora da estrada.
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